sexta-feira, 12 de novembro de 2010

Apenas um Beijo de Boa-Noite

Passou pela portaria sem problema, o porteiro noturno de plantão o conhecia. Enquanto atravessava o pátio de carros populares sacou do bolso esquerdo da jaqueta jeans o aparelho portátil. Não precisou digitar as pequenas teclas correspondentes à seqüência numérica desejada. O número dela já estava salvo, há pouco tempo. Após dois toques atenderam, ele disse, Oi! Sei que está muito tarde, mas eu poderia passar aí pra ti dar apenas um beijo de boa-noite? O sorriso largo em seus lábios denunciava que seu pedido foi aceito. O indivíduo acelerou o passo. Este morava no quinto andar do bloco F, a outra no quarto andar do mesmo bloco. Conforme o indivíduo subia as escadas, as luzes iam se acendendo automaticamente. Percebia-se que o indivíduo se tratava de um corado rapaz. Devia ter seus vinte e poucos anos. Jovem e afoito. No quarto andar parou. Aqui a luz externa não acendeu. Bateu três batidinhas quase inaudíveis. A porta foi aberta segundos depois. Uma luz branca, um perfume almiscarado penetrante e um sorrisinho malicioso e convidativo na face parda causaram-no uma espécie de paralisia. Só cruzou a porta quando ouviu, Oi, meu lindo! Entre. Enquanto a porta era fechada à chave, os dois ficaram se olhando, apenas exibiam os dentes perolados um para o outro. Porta trancada, a luz branca se apagou. O som que se ouvia na penumbra do apartamento quarenta e quatro era o do fluxo contínuo e circular das salivas e dos estalos labiais cortados. Dava pra ouvir os cochichos dos dois, Saudades de você. A temperatura dos dois corpos aumentou ligeiramente. Ambos os corações estavam se acelerando. A mulher emparedou o jovem. Movimentos pélvicos eram perceptíveis. Gemidos contidos agora eram ouvidos nitidamente, deliciosamente. Mais cochichos se ouvia, Se continuar assim... Tira isso... Vêm... Ai... Aí... Não... Assim não... Tem preservativo?... Melhor sem... Melhor com... Doido... Você é estranha... Vou pegar... Você põe então... A mulher pôs, ao contrário. O jovem endireitou. A mulher o agarrou pela jaqueta jeans e disse, Vem logo! Aqui. E os dois deitaram-se num colchão ali já estendido. Ele sobre ela. E fornicaram. E gemeram. E disseram-se, Assim eu gozo logo... Assim mesmo, não pára... Não grita... Não grita... Levanta a minha perna (esquerda)... Isso... Assim... Vai... Gostoso... Não é gostoso?... Assim?... É... Muito... E gozaram, juntos, aparentemente. Beijaram-se, amavelmente, longamente. O jovem foi ao banheiro cambaleante, no escuro. A mulher dedou o canto dos olhos e revestiu a calcinha preta. O jovem a beijou, novamente, quando do banheiro saiu, sorridente. A mulher já estava de pé, esperando-o. Abraçaram-se, amavelmente, longamente. O perfume corpóreo de cada um foi-se transferido, transmitido ao outro. Olhos brilhantes se despediram, demoradamente. Não se olharam mais enquanto a porta era destrancada, aberta lentamente. A mulher antes de fechar a porta ainda fitou as costas do jovem. O jovem encarou a escuridão do corredor, olhou para trás, e sorriu, ainda podia ver sua algoz na penumbra particular. O indivíduo subiu o restante das escadas até seu próprio apartamento de número cinqüenta e dois. A cada passo que ele dava, o sorriso satisfeito e sincero em seus lábios foi-se desmanchando, tornando-se triste, um sorriso triste. Quando adentrou seu recinto, trancou negligentemente sua própria porta. Cambaleou direto a seu quarto de solteiro. E desabou duro de roupa e tudo. O coração parou, finalmente.

Um comentário:

  1. A fim de evitar constrangimentos a terceiros e possíveis difamações em ambiente público, faço aqui uma ADVERTÊNCIA: o texto acima é totalmente uma obra de ficção. O mesmo não é baseado em nenhuma vida alheia. Ele é uma espécie de amálgama de diversos comentários, de diversas fofocas, por mim, autor, ouvidos por aí durante toda a minha vida em condomínio. Por favor, não o considere autobiográfico, ou mesmo auto-retrato de alguém conhecido por você, caro leitor. Aprecie-o com moderação.

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