domingo, 28 de fevereiro de 2010

E a Amizade, cadê?

Sabe, lendo o Feliz Ano Velho, do Marcelo Rubens Paiva, fiquei com uma puta inveja dêle. Sério. O cara se fudeu veio, e duma forma meio que boboca até, mas, mesmo assim, lá estavam TODOS os seus amigos – verdadeiros amigos -, dando fôrça pro cara, do lado dêle, sempre. E, cara, pensei: pôxa, por que num tenho amigos assim? Amigos presentes, entendes? Sério. Os pouco que tenho, peraí... Aliás, pra ser sincero, creio, após a leitura do livro, e após umas reflexões cá comigo mesmo, não ter amigo nenhum; tampouco amigo-presente. Os que'u tinha, se fôram, debandaram, seguiram rumos diversificatórios. A gente vai crescendo com uns guris aí, e umas raparigas, e dispois cada um vai seguindo sua vidinha miserável e monetária, cada um pr'um lado do mundo imundo. Não se ligam, não se correspondem, não se vêem mais quotidianamente, sabe? Arranjam coisas “melhores” pra fazer, pra se entreter. Arranjam amores fugazes, amores fixos, casam-se e proliferam-se - o coito é bem mais interessante e instigante. Uns, arranjam inté outras ditas amizades, na esperança de preencher o vazio deixado pelas anteriores. Sim, êsses desgraçados ainda sofrem com a Solidão. Outros, arranjam um trampo; preferem seguir a carreira profissional e/ou acadêmica escolhida a duras penas.

Hoje em dia, os humanóides apenas se conhecem, e de vista apenas, sabe? Não há, nem vejo aquele comprometimento sacaninha, aquela intimidade agradável, aquele respeito mútuo, aquela estima típica e característica d’Amizade legítima. As pessoas da contemporaneidade só se importam com seus umbigos sujos; e estes estão cada vez mais e mais fundos... Um horror! Cruzes. Mas, admito, há amigos-fantasmas, sabe? Êsses são aquêles que surgem derrepente, do limbo mesmo. Assim: tu tá lá cunhando, cuidando da tua vidinha e, do nada, o telefone toca: é o tal do amigo-fantasma, que só se comunica via Embratel. Êsse só ti liga quando tá precisando duma grana. Sério. Teu cabelo arrepia logo porque, primeiro: sabes agora que o cara tá vivinho – e isso já é surpreendente - e, segundo: o cara-de-pau têve a moral de ti pedir dinheiro – e isso já é assustador! Pede na lata e sem vergonha nenhuma. Quem êle pensa que é? Uma puta fogosa e descolada? Nem isso, pô! Não vale o trôco. Nesse instante dá mesmo vontade de esganá-lo com o próprio cinismo; pena êle estar doutro lado da linha... Pederasta maldito!... E, pior, ainda liga a cobrar! Porra!... Já com as minas é diferente. Assim: tu tá lá cabisbaixo, precisando pôr pra fora umas angústias aí e quando liga pra dita cuja, lá vêm ela com umas desculpinhas indigestas: “num dá, tá frio”, “num dá, tá calor”, “num dá, já vou dormir”, “num dá, tá tarde”, “num dá, tá muito cedo”, “num dá, tenho namorado”, “num dá, vou tômar banho”, “num dá, já vou sair com uma amiga duma amiga minha” e por aí vai... Pôxa vida, que custa papear um bocadinho com um amigo necessitado?! E não há segundas intenções, caso tu aí, leitora maliciosa, esteja desde já matutando. Se ver só pra prosear mesmo, nada mais, juro. Esse mundinho anda tão desconfiado... PUTZ!!! Eh isso. Vislumbro (agora) claro com clareza: a Desconfiança enxotou a Amizade do cenho hominídeo. Só pode ser isso mesmo. Soa tão verossímil (agora). Mas, se a Desconfiança reina cá na cachola, e a Amizade, cadê? Pr’onde foi? Tu sabes?

segunda-feira, 15 de fevereiro de 2010

SSMS (20)

Enquanto eu cá admiro uma foto tua do passado, uma certeza se impõe: tu estas linda cá em mãos, mas ti estimo maravilhosa, meiga e irresistível hoje e ao vivo!!

domingo, 14 de fevereiro de 2010

Fragmentos do cotidiano (3)

A desgraçada não dava folga. Mesmo espremidos no trem lotado, Ela o segurava pelos bolsos da calça. A despudorada ainda demonstrava pudor: só roçava suas unhas cumpridas e vermelhas nas coxas da vitima, evitava a região pulsante... Só pra provocar, era óbvio! O sorrisinho cínico e malicioso se exibia na sua face alva, discretamente maquiada. Tinha um semblante angelical, mas um desejo dos diabos! A vitima sorria também, queria ir à desforra com a descarada. Sentia-se no direito irrevogável, afinal, não fora Ele quem começara. Era inocente. Com o braço direito mantinha o seu corpo ereto, com o esquerdo abraçava o dorso da amiguinha e a mantinha ereta também, apenas por consideração, entendes? Estavam firmes! Não poderiam cair. As “turbulências” eram freqüentes: corpos suados se encostavam, balançavam de um lado a outro do vagão-forno; calores alheios sentidos; secreções pegajosas trocadas; e um casal, no meio, acasalando... As janelas embaçaram tão rápido!

Chegando à estação, Ela se virou, ficou de costas para a vitima (ai!). Ajeitou o cabelo negro, liso e desgrenhado; com a nuca à mostra, podiam-se ver os salpicos de suor reluzentes (ui!). Ela ajeitou a blusinha, ajeitou a calça jeans clara e apertada com rapidez e de forma bem elegante até (ai!). E foi embora. Não olhou para trás (ui!).

Quanto a vitima, esta ficou lá, parada, admirando o requebrar generoso de seu algoz.

Não trocaram palavras, nenhuma, juro! Não precisaram (ou não queriam), acho. Não houve nada, apenas uma impressão.

sexta-feira, 12 de fevereiro de 2010

O desempregado desesperado

Não teve jeito. Tinha que acordar cedo e encarar a maratona estafante urbana. Levantou-se da cama às sete e quinze da manhã de sexta. Aprumou-se, engoliu um cafezinho amargo e saiu de casa apressado. Chegou ao ponto de ônibus pingando suor – prova de seu orgulho ferido, da sua juventude sedentária. A lotação (espécie de micro-ônibus) estava lotada - nada mais condizente com o nome de batismo. Sua pasta plástica cutucava os demais passageiros, o mau humor dos demais arranhava sua paciência masculina. Ficou em pé, não tinha lugar pra se sentar, nem pra se mexer direito, só à esquerda mesmo. O trajeto costumava levar meia hora, no máximo; nesse dia, levou quase uma. O transito local estava mau, véspera de carnaval, sabes como é. Ao descer da condução, quase tropeçou, digo quase porque conseguiu se recompor. Na rua, do ponto ao seu destino, esbarrou em três pessoas: numa senhora distraída, numa moça apresada e num senhor mal humorado. Da senhora teve pena, da moça um comichão e do senhor indignação. Adentrando no seu destino, esqueceu-se de tudo. Havia muitos como ele, haviam mais de duzentos na sua frente. Não teve jeito. Teve que aguardar a sua vez, pacientemente, maliciosamente, criativamente. A troca de cadeiras era constante, parecia uma dança humilhante e despudorada. E os “dançarinos” só conseguiam sorrir sorrisos amarelos. O destino flertava com o desemprego emergente. Era horrível. Era real? O devaneio era persistente, não queria se desanuviar de lá... Após duas horas de espera, foi atendido – até que foi rápido! Atualizou seu cadastro, aguardou mais alguns minutinhos e saiu de lá com uma cartinha de indicação – objetivo de todos, sorte de poucos. Não poderia comparecer ao local no mesmo dia, já passava das doze horas, ficaria pra segunda então, fazer o quê? Com a cartinha na pasta, estava mais tranqüilo, o Clima escaldante já não o incomodava tanto. Resolveu ir a outro posto de encaminhamento, um mais longe, lá pros lados do centro. Arranjaria coisa melhor? Não queria perder mais tempo. Foi. O tal posto ficava dentro duma estação de metrô, pegou outra lotação, não tinha opção. Nessa, também foi em pé... No metrô, conseguiu se sentar, num lugar especial - não havia outros para reclamá-lo. Aproveitou a pequena viajem como melhor pode: pescando... Na estação de destino, fez baldeação, sem balde, claro, mas com uma rede na mão. No posto, não demorou tanto pra ser atendido, não havia tantos como ele, apenas uns dez na sua frente. Esperou de barriga vazia, mas com a Esperança do seu lado. Ela não alimenta o corpo, apenas a alma. Dessa vez não recebeu uma cartinha, apenas uma palmadinha. Não teve jeito, voltar pra casa era a única opção. Pegou o trem dessa vez, era mais rápido e mais barato – o dinheirinho estava escasso. Não queria gastar mais do que já tinha gastado, e era muito!

Em casa, trocou de roupa, pôs uma mais confortável, odiava se paparicar pra sair. Não almoçou, estava sem fome. Estava sem ânimo, só queria deitar-se. Segunda-feira então era o dia, mais um dia! Passaria mais um fim-de-semana se iludindo. Não tinha escolha. Não teve jeito.