terça-feira, 22 de março de 2011

Sinapses duma tarde vagabunda

- Veja: até as pombas da Augusta são safadas. Olha como elas vão avidamente, descaradamente para de baixo das mesas em busca de comida. São mui atrevidas mesmo! Nem se intimidam. Vão e bicam tudo que encontram pela frente.

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“Sisos”

Perdi os sisos recentemente, aos poucos. Dois se foram de uma vez só! Num sábado de sol. Fiquei o dia inteiro cuspindo sangue. Um sangue escuro e consistente. Outro siso perdi sozinho, quase duas horas levou. E a dor, só veio depois. Depois que eu o perdi. A dor é uma manifestação da saudade, acho. De algo que deveria estar lá, pois sempre esteve, e agora não mais está. O último siso perdi semana passada. Levou quase duas horas também. Muito cansativo. Espetaram-me muitas anestesias, mas, no fim, quando o siso apegadíssimo ficou livre, a dor foi muito intensa. Meus olhos lagrimejaram instantaneamente. Até gemi. E a dor recente demorou a passar. Não me sentia nada bem. Tonto fiquei. Até cambaleei; minhas pernas demonstravam fraqueza precoce. Suado estava. E sem siso algum, finalmente. E dessa vez nenhum hemisfério da face estava exageradamente inchado. Parecia bem. Suspeitava que essa última cicatrização fosse mais tranquila que as anteriores. Engano. Houve, há dores, aquelas dores chatas, incômodas... Mas, contudo, sobrevivi. Posso ter passado os últimos dias de março, da primavera, amarrado, mas vislumbro que em abril, um novo mundo se abrirá diante de mim. Sem sisos veremos até onde vou, pois este outono promete! Apesar das quedas, das extrações forçadas e devidamente cobradas, e quitadas, um novo sorriso, uma nova voz e outra faceta da minha personalidade serão – até que enfim! – visíveis, e audíveis!!

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Quando as amizades do presente não satisfazem mais suas necessidades afetivas, é hora de conquistar novas e sinceras amizades. Vale a pena resgatar amizades do passado. Alguns fantasmas podem até, agora, agradar, serem mais camaradas. Mas, infelizmente, como são fantasmas, costumam desaparecer sem motivo aparente. Solução então: insistir na conquista de novas e leais amizades. Quanto mais velho você é, isso é possível? Talvez sim, talvez não. Dependerá de quem procura. E procurar faz-se necessário. Ficar parado a esmo não é legal. Saia sozinho, por ora. Divirta-se consigo mesmo! Encontre pessoas no mundo real. Viver realmente é necessário.

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Realmente é fascinante ver o quanto o corpo humano é capaz de se adaptar diante da realidade! Você aí que pega o Expresso Leste diariamente já viu. Acho que todo o mundo já viu a nossa capacidade humana de dormir em pé dentro dum veículo em movimento. Como isso é possível?! Desconheço as explicações científicas, físicas. Só comento aquilo que vejo. Digo: é impressionante. Até eu, que pega o tal expresso, já tirei uns cochilos em pé, entre a multidão espremida de trabalhadores. Não foi um cochilo daquelas pós um bom almoço, mas foi um em que eu não caí, então, já tá de bom tamanho. E, olhe, nem me apoiei ou me encostei em alguém. Mantive, como muitos, o equilíbrio e uma certa consciência; não dormi literalmente, só aparentemente. Quando dei por mim, já estava abrigado na estação Luz. Nosso corpo cansado do trabalho do dia anterior acaba arranjando uma maneira de descansar. Até onde vai esta natureza humana? Chegará um dia, de manhãzinha, em que finalmente cairemos e não conseguiremos mais levantar? Espero mantermos o natural equilíbrio por um bom tempo... Este tempo, nosso tempo, escorre lentamente. Um dia ele, e nós, consequentemente acabaremos. Eh, não temos mais tempo. Fim dos tempos.

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