Dizem que as cicatrizes
revelam a estória de um homem. Dizem que elas são responsáveis pelo seu
caráter, pela sua índole; são elas que determinam a atitude dele perante o
mundo. Isso faz pensar. Um homem sem cicatrizes pode ser considerado um
homem de verdade? O que é ser homem afinal? E eu, o narrador, substantivo
masculino, até tenho um bocado de cicatrizes pelo corpo, mas elas são
consequência direta do meu jeito estabanado de ser, posso, mesmo assim, ser classificado
como homem? Existe homem sem cicatrizes? Talvez minhas cicatrizes
denunciem o meu jeito despojado de ser. Eh, confesso, sou meio inconsequente
mesmo. Mas ainda estou aqui, narrando. Quanto aos outros sujeitos do sexo
masculino que estão extratexto, suas cicatrizes talvez indiquem o imenso
trabalho que eles têm para viver esta vida severina. Convenhamos, toda cicatriz
já foi uma grande ferida aberta, uma ferida que não fecha facilmente. Eh, essas
marcas na pele são vias de acesso que, mesmo pavimentadas, poucos são
autorizados a tocá-las. Afinal, não é qualquer um que quer liberar o próprio
corpo, assim, pra qualquer um.
segunda-feira, 31 de outubro de 2011
domingo, 30 de outubro de 2011
SSMS (66)
Mais uma semana se aproxima. Aí
vc se pergunta, de novo: até onde mais eu vou aguentar? Mente e corpo estão
malhados. Vai ver é justamente por isso q vc tá aí.
SSMS (65)
Doar-se é algo muito pessoal.
Se você realmente quer ajudar uma pobre alma, digo-te: doe! Ainda estou
aceitando corpos em bom estado de conservação e paixão.
sábado, 29 de outubro de 2011
SSMS (64)
Um corpo ou um colo feminino é, sem dúvida, o remédio do qual careço. Meu caso é terminal, mas facinho, facinho de ser resolvido. Só faltam boas doadoras mesmo!
quarta-feira, 26 de outubro de 2011
Os fones da indiferença
Quem pega transporte público
todos os dias para ir trabalhar sabe: educação é coisa rara. E quando
presenciamos tamanha erudição até ficamos meio que sem jeito, sem saber ao
certo o que dizer. Um obrigado já é suficiente. Tem gente que dá um sorrisinho.
E tem gente indiferente. Aliás, taí outra coisa que considero interessante de
ver de dentro do transporte público: a indiferença. Ela é abundante hoje em
dia. Você, caro leitor, certamente já a viu por aí. Se não, sem problema, fique
tranquilo, vou abrir seus olhos. Dica: repare bem na quantidade de pessoas a
sua volta que estão usando fones de ouvido. Consegue conta-las? É um bocado de
gente, não é verdade? Pois então, taí a manifestação da indiferença dos nossos
tempos. A pessoa fica lá curtindo seu som à vontade, isolada do ambiente hostil
que é o transporte público. Não interage com ninguém, fica lá cativa em si
mesma. Aí, eu pergunto: cadê o flerte? Comé que fica a porra da vida em
sociedade, hein? Perdem-se essas coisinhas tipicamente humanas e tão essenciais.
Acho que o ser humanoide tá é mais interessado no seu próprio prazer,
preferindo se evadir dos momentos áridos da vida. Atitude inútil, pois quem
sabe das coisas sabe muito bem que a vida é perigosa. Só os fortes vivem, quem
sobrevive é fraco, ou é uma pessoa duma puta sorte! A indiferença é uma
fraqueza, quanto a isso não há dúvida. E o que podemos fazer para modificar
isso? Simples. Temos que ser atrevidos, temos que encarar esses seres até que
notem a gente, seus vigias de acaso. Assim, quem sabe, começam a pensar em
alguma coisa ou fiquem tão incomodados e nos dirijam a palavra: - Que que cê tá olhando? Nunca viu, não?!
Aí a gente diz: - Já. Sempre vejo a
indiferença por aí. Pronto. Basta só manter o papo, quem sabe assim uma
pessoa interessante se revela, né verdade? Pelo menos o primeiro contato foi
feito. E assim a gente vai evoluindo...
segunda-feira, 24 de outubro de 2011
Bar Noir
Ele não tinha outros planos.
Era véspera de feriado e ele já
tinha se decidido: iria sair. Já estava com um bar em mente. A Banda iria tocar
lá.
E ele curtia A Banda. Eles
tocavam um blues bacana, as letras eram diretas, sem frescura, e faziam rir,
gritar; eram músicas para almas velhas dessossegadas.
Mas ele era jovem, só não tinha
um par pra noite. Resolveu ir sozinho mesmo. Estava nessa fase agora. Não tendo
companhia disponível, ia pra noite com ele mesmo.
Saiu de casa lá pras nove.
Pegou a lotação. Pegou o metrô e fez duas baldeações. Cruzou a cidade rumo ao
centro da cidade. Destino: Rua Augusta. Nessa rua ele se sentia bem, dava pra
ver na cara dele. Caminhava pela calçada estreita e lotada de gente com um
sorrisinho de satisfação nos lábios finos.
Eram dez e pouco, ainda estava
cedo pra ir pro bar d’A Banda. Resolveu parar umas quadras antes, noutro bar.
E lá, de pé mesmo, decapitou
uma, duas, três garrafas de cerveja. Estava matando o tempo e o seu fígado,
lentamente. Aproveitou que estava ali, de boa, e tentou paquerar um pouco.
Ficou um bom tempo de olho na mina de corselete preta do balcão, mas logo viu
que não era correspondido. Ainda ficou olhando as gurias que passavam em pelo
pela rua, mas também não teve sorte. Essas passavam acompanhadas ou
distraidinhas com latinhas de cerveja na mão. Desistiu de flertar e matou o
último americano numa virada só. Pagou e saiu pra rua.
Eram quase onze e meia, e A
Banda sempre começava a tocar lá pras onze e meia. Chegou ao bar junto com A
Banda. Entrou, deu o nome completo e pegou a comanda. Conseguiu um lugarzinho,
nos fundos, e no balcão. Pediu uma cerveja. E ficou lá, bebendo, olhando seus
colegas de bar daquela noite. Gostou da bartender. Uma loirinha branquinha dos
olhos castanhos claros, bem claros, e alargadores discretos nas orelhas. Os
olhos dela tinham um contorno negro bem feito e os lábios vermelho-sangue
exigiam atenção. Devia ter a mesma faixa etária dele, uns vinte e poucos
aparentava. Uma graça. Não a cantou por respeito ao seu trabalho, afinal, ele
estava lá curtindo e ela estava trampando.
A Banda tocou seus sucessos,
antigos e novos. O ambiente era pequeno, intimista. Gente ainda entrava, a casa
estava enchendo. E ele lá tomando mais uma cerveja e secando o leitoso par de
pernas ao seu lado. Algumas mulheres realmente não têm misericórdia.
A Banda mandava uma atrás da
outra, tomavam whisky e detonavam. Viam-se pessoas dançando, umas timidamente,
outras freneticamente. Era bonito de ver, e ouvir. Ele resolveu dançar também.
Balançava o corpo, a cabeça e
tocava uma guitarra imaginária. Ou seria um baixo imaginário? Não dava pra
saber direito, movimentos espasmódicos ele fazia. Era meio engraçado de ver. E
já pegava outra cerveja com a loirinha.
O banheiro do bar era legal.
Comunitário. Homens e mulheres lá entravam. Paquera e sexo, muito sexo, lá deve
ter rolado, e ralado. Mas ele só fazia uso primário dele. Ele já estava tonto,
meio alto, andava cambaleante entre as pessoas, mas continuava cantando as
músicas d’A Banda. Viu um assento vago e se enterrou lá.
Ele provavelmente delirava, era
visível, estava encarando fundo as almas dos outros e dedilhando as paredes de
vidro ao redor. De lá sentado, chamou, com o dedinho indicador, uma loiraça que
estava de pé no balcão.
E ela veio em sua direção,
abaixou-se e lhe falou algo no ouvido. Não dava pra ouvir direito, A Banda
continuava detonando alto, bem alto. Os dois sorriam um pro outro, trocavam
confidências ou demências ao pé do ouvido.
A loira era do tipo muito
atraente. Estava de bota preta, calça legging azul e regata preta bem justa ao
seu corpo. Essa tinha a língua vermelha dos Stones estampada na frente, o que
só sugeria o que deveria ser feito com aquele generoso par de seios alvos...
De repente, ela se levantou. E
ele, sentado ainda, apertou, por trás, a coxa direita dela. Esfregou a cara na
perna dela, e foi subindo, deslizando até a barriguinha seca da menina. Ela
voltou a se abaixar. Cochichou algo em seu ouvido e tascou um beijo nele.
Na boca.
Levantou-se e foi dançar.
Ele continuou sentado,
delirando. Foi ao banheiro. Pediu mais uma cerveja pra loirinha das orelhas
alargadas. Dançou mais um pouco. E despencou mais uma vez numa das poltronas do
fundão. Na do lado, havia uma mina.
Papearam um bocadinho sobre o
show. E esta apresentou a amiga. Disse-lhe que era a primeira vez dela, da
amiga, num show d’A Banda. Ele e a amiga da mina bateram um papo. A mina foi
dançar. E, do nada, os dois recém-conhecidos começaram a se agarrar ali mesmo,
sem vergonha ou preocupação.
Essa tal amiga era magrinha.
Tinha uma boa cabeleira. Um castanho escuro até os ombros. Eram deliciosamente
naturais.
Ele e ela se beijaram muito.
Ambos agarravam a cabeça um do outro. Era selvagem a cena. Ele enfiou a mão
esquerda entre as pernas dela. Ela a segurou, reteve-a, estava muito próxima
da...
A mão direita dele apalpava a
bunda dela. E que bunda! Rabinho lindo, e molhadinho de cerveja. Ela tinha
sofrido um pequeno acidente. Não conseguia explica-lo direito. Os dois amantes
do acaso ficaram se agarrando por um bom tempo. Era fascinante vê-los.
Ela acabou indo embora, sem o
casaco. Este, ele usou como cobertor antes de ir embora também. Parecia uma
criança no fim de festa dos adultos.
Ele foi embora sozinho, do
mesmo jeito que havia chegado. Foi subindo a Augusta trôpego, mas atento.
Estava amanhecendo e ainda havia muita gente na rua. Conseguiu chegar à estação
do metrô sem ser atropelado nem ter esbarrado em alguém no mesmo estado etílico
que ele. Estava cansado o menino. Deu várias pescadas durante o caminho de
volta pra casa. E ainda perdeu o ponto de descida, desceu quatro pontos depois
do seu.
Chegou em casa lá pras sete.
Morava só. Foi se despindo até o quarto. Deixou uma trilha de roupas suadas
pelo chão da casa. Diante da cama de solteiro, apenas de cueca, capotou de
bruços.
E dormiu até sei lá que horas.
Era feriado.
terça-feira, 11 de outubro de 2011
SSMS (63)
Ñ paro mais de ti mandar msgs. E ñ é por causa de promoção ou bônus fortuito, ñ. Depois q vc me disse q carrega seu cel entre as coxas, vibro todinho de emoção!
sexta-feira, 7 de outubro de 2011
por dentro da sociedade bipolar de hoje
eu dou pinta e não pistas
doo subterfúgios
roubo agiotas
e coleciono fungos
não tenho paciência
e, na minha imprudência,
gozo próximo à superfície
sem esquife ou estalactite
sei saborear uma borboleta de
plástico
sei subornar um chauvinista
incendiário
acredito em sagitário
mesmo sentindo asco
acorrentado me sinto
e sem juízo
falsifico sentimentos
nada mais é tão verdadeiro
o derradeiro
palhaço desavergonhado
e canhestro
é a dita juventude transviada
de agora
repleta de acne e pus
naquela face plácida
e demente
desprezo a mim mesmo todos os
dias
sinto-me sem saída
não há ninfeta
ou puta coxa
que me dê alento, alimento
necessário e indispensável
pra sanar, aplacar
o meu mais novo tormento
ando aborrecido
tanto faz ou tanto fez
já não sei bem
talvez
quarta-feira, 5 de outubro de 2011
A encruzilhada na carreira sem rumo
A situação já se tornou
insuportável. Não aguento mais este lugar. O trampo não tá mais rendendo. Tô de
saco cheio. Quero sair. Cair fora logo. Mas não posso. Ainda não. Tá mó crise lá
fora. Trabalho decente tá difícil de arranjar. Não posso vacilar. Tenho contas
pra pagar. Tenho que me sustentar. Tenho que sobreviver de algum jeito. Não
posso sair assim de supetão, que nem da última vez. Naquela vez, me dei mó mal.
Fiquei meses parado. Só coçando e batendo perna, não necessariamente nessa
ordem. Foi duro. Não quero mais passar por aquilo novamente. Tá certo. Sair.
Mas pra onde? Pra que raio de emprego vou? Trabalhar no quê? Certo. Na minha
área. Qual é mesmo a minha área? Sei lá. Já faz tempo que sou escravo do
comércio. Esse ramo desumano sempre me convoca, me sufoca e me enforca. Careço
de férias. Não, imbecil! Eu tenho é que cair fora. Dar no pé. Mas pra onde
mesmo? Merda! Tô me repetindo. Tá. Um lugar legal. Bacana. Mais haver com o meu
perfil. Meu perfil? Putz. Que porra é essa? Calma. Beleza. Sou tranquilo. Um
cara sossegado. Sei trabalhar em grupo, mas curto, e sou mais produtivo, quando
trampo sozinho. Acostumei com a solidão. Penso melhor no silêncio. Certo. Sou
proativo também. Não gosto de acordar cedo, mas, se levanto, mesmo obrigado,
trabalho. Não enrolo; faço o que tenho que fazer. Sou comunicativo. Simpático.
Tento entender o próximo. Não faço pré-julgamentos ou falsos testemunhos. Sou
sincero pra caramba. Talvez bem aí eu tenha vacilado. Bem, esse é um bom
perfil? É um bom resumo, que diz o que quer dizer. Tá. Agora. Que tipo de
trampo combina com ele? Editor? Livreiro? Ou celibatário? Professor? Revisor?
Ou bancário? Difícil. Minhas aspirações não batem com a realidade. Vivo apegado
ao fantasma da ficção diária. Esse paliativo que virou um vício viçoso.
Escritor então? Se ganha bem sendo escritor? Dá muito trabalho ou é apenas uma
aptidão?? Perguntas demais, respostas de menos. Acho que vou aderir à greve ou
tirar umas férias de mim mesmo. Sou eu ainda insuportável. Se almejo
desencarno.
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